Nadas
09:29Nunca vos aconteceu ter um pedaço de nada que vos pesa nos braços? Não um nada vazio, como o nada da junção de um electrão e um anti-electrão ou de vácuo. É um nada que é talvez a ausência mas também a presença de algo, um peso que não carrega mais ninguém. É talvez como o mito, "o nada que é tudo". E nessa contradição de não ser, sendo, ora nos convence de que é antecipação como nos garante que é devaneio da languidez dos dias. O que é que ele tem de verdade? Não, nunca é uma pergunta retórica. Ou talvez seja, se a verdade o diluir e o derreter até não passar do nada e ser só mesmo isso, ou melhor, não ser. Matar esse nada pode pesar bem mais do que carregá-lo enquanto o mantemos vivo.
Ainda se os nadas andassem sozinhos... Oh, não, os nadas aspiram sempre a tornar-se em alguma coisa que é demais para eles. Sonham encontrar um outro nada que possa fazer deles algo real. E o pior de tudo é que são cegos, não sabem que a realidade é muito mais vezes a inimiga do que a companheira compreensiva. Não se apercebem que, tantas vezes, não têm nada em comum (e este "nada" é mesmo o do vazio) e que um destrói o outro. Depois a realidade, que tem a presunção de estar sempre certa de tudo, costuma ganhar este combate, a não ser que esteja de acordo com o nada. O problema é que a realidade é orgulhosa e não deixa que seja assim tão fácil percebermos onde ela está. Ou se calhar somos nós que que andamos mudar de passeio sempre que ela parece vir na nossa direcção para podermos continuar a carregar o nosso pedacinho de nada.
Somos curiosos, nós e os nossos nadas que são uma tralha de coisas. Estando nós próprios condenados a ser, aconchegamo-nos na perseguição do inacessível. E continuamos sempre, não vá o universo mudar.
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